Bacellar é preso por suposto vazamento de operação contra TH Jóias com picanhas como código

Bacellar é preso por suposto vazamento de operação contra TH Jóias com picanhas como código
Luana Bassaneze 8 dezembro 2025 0 Comentários

A picanha virou símbolo de um dos escândalos mais estranhos e graves da política carioca. Não era só um corte de carne armazenado em freezer — era um sinal. Um alerta. Um código. E, segundo a Polícia Federal, a chave que abriu a porta para um vazamento de operação contra o ex-deputado Thiego Raimundo dos Santos Silva, conhecido como TH Jóias, um dos principais articuladores do Comando Vermelho dentro do poder legislativo. O alvo da operação? O próprio presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar, preso preventivamente em dezembro de 2025 por ordem do ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF).

As picanhas e o telefonema que mudou tudo

Na noite de 14 de setembro de 2025, um dia antes da operação da PF que prendeu TH Jóias em sua residência em São Gonçalo, o ex-deputado enviou vídeos para o celular de Bacellar. Neles, mostrava cortes de picanha em freezers, com comentários como: "Vou roubar a carne amanhã" e "Essa aqui é a melhor do mercado". O contato de TH Jóias estava salvo no telefone de Bacellar como "Predestinado" — um apelido que, na visão da PF, não era casual. O que parecia brincadeira de confraternização, na verdade, pode ter sido uma tentativa de alertar sobre a iminência da operação. Horas depois, um caminhão foi visto saindo da casa de TH Jóias, retirando documentos, equipamentos e prováveis evidências. Na manhã seguinte, às 6h, TH Jóias enviou fotos dos agentes da PF já dentro de sua residência. Bacellar, segundo depoimento, ficou "surpreso". Mas a surpresa foi mesmo da PF: o vazamento havia ocorrido.

"Nunca o tinha visto na vida" — e depois, a conversa

Durante o interrogatório, Bacellar afirmou categoricamente: "Nunca, nunca o tinha visto na vida". Mas a PF trouxe provas contrárias: 17 mensagens de texto trocadas nos 15 dias anteriores à operação, além de três ligações na véspera. Em uma delas, TH Jóias perguntou diretamente: "Fala 01... Você está sabendo de alguma coisa de operação amanhã pra mim?". Bacellar respondeu: "Não, não tenho informação". Mas, segundo a investigação, ele não apenas recebeu a ligação — ele a aguardava. O presidente da Alerj, filiado ao União Brasil, tentou justificar o contato dizendo que, como presidente do Parlamento, "tem que atender todos indistintamente". Mas admitiu: "Ah, o pessoal fala que é ligado a comando, sei lá o quê". Essa frase, dita com indiferença, tornou-se um dos pontos mais críticos da acusação.

TH Jóias: o elo entre o crime e o poder

TH Jóias não era apenas um ex-deputado com passado criminoso. Era o braço direito do Comando Vermelho dentro da Alerj. Segundo relatório da PF, ele era responsável por lavar dinheiro da facção por meio de empresas fantasmas, negociar armas de grosso calibre e adquirir equipamentos antidrones — tecnologia usada para bloquear rastreamento em prisões. Além disso, ele teria usado sua influência parlamentar para proteger integrantes da facção, garantir visitas privilegiadas e até influenciar decisões judiciais. A PF aponta que sua prisão em setembro de 2025 foi o resultado de meses de monitoramento. E o vazamento, segundo a força-tarefa, "obstruiu o andamento da ofensiva anterior" — ou seja, a operação que poderia ter derrubado toda a rede antes dele.

As evidências que não deixam espaço para dúvidas

A PF não dependeu apenas das mensagens. O vídeo do Fantástico, exibido em 7 de dezembro de 2025, mostrou imagens de câmeras de segurança que registraram a movimentação do caminhão na noite anterior à prisão. Também foram encontrados registros de chamadas entre Bacellar e outros "contatos estratégicos" — incluindo assessores da Alerj e um ex-policial militar com ligações ao crime organizado. O mais chocante? Bacellar se recusou, em seu depoimento, a apresentar imediatamente os comprovantes de suas justificativas. "Vou me reservar o direito de apresentar depois a comprovação", disse. Para os investigadores, isso foi um sinal claro de que ele sabia que não tinha o que provar.

Reações e o que vem a seguir

Reações e o que vem a seguir

A defesa de Bacellar nega "qualquer tentativa de obstrução ou vazamento de informações", alegando que as conversas eram "inocentes e sem conteúdo sigiloso". Já os advogados de TH Jóias afirmam que seu cliente "não tinha conhecimento prévio da operação" — o que contradiz as próprias mensagens que ele enviou. Enquanto isso, o STF mantém Bacellar detido em regime fechado, aguardando julgamento. TH Jóias permanece preso no Complexo Penitenciário de Gericinó, em São Gonçalo, desde 15 de setembro de 2025.

Este caso não é só sobre uma picanha. É sobre o que acontece quando o poder legislativo se torna um abrigo para o crime organizado. É sobre como mensagens aparentemente triviais podem esconder estruturas criminosas profundas. E é sobre o que acontece quando um presidente de assembleia, em vez de proteger a democracia, se torna um canal de fuga para quem quer destruí-la.

Um precedente preocupante

Este não é o primeiro caso de vazamento de operação contra facções no Rio. Em 2021, um ex-secretário de Segurança foi preso por entregar informações sobre a operação "Cadeia do Crime". Mas nunca antes um presidente de assembleia legislativa havia sido acusado diretamente. O que torna este caso ainda mais grave é o nível de intimidade: o uso de apelidos, o envio de vídeos cotidianos, a conversa em horário de pico — tudo indica que a relação não era formal, mas pessoal. E isso, para a PF, é a pior das violações.

Frequently Asked Questions

Como as picanhas podem ser um código de vazamento?

Na investigação, a PF interpretou as mensagens sobre "roubar a carne" como metáforas para alertar sobre operações policiais. Em contextos criminosos, objetos do dia a dia — como comida, roupas ou até nomes de bairros — são usados como códigos. O fato de TH Jóias enviar imagens de freezers cheios de picanhas horas antes da prisão, e depois enviar fotos dos agentes entrando em sua casa, cria um padrão que a PF considera coerente com uma tentativa de aviso.

Por que Bacellar foi preso e não apenas afastado?

O ministro Alexandre de Moraes entendeu que havia risco de obstrução da justiça, já que Bacellar se recusou a apresentar provas imediatamente e mantinha contato com outros envolvidos. Além disso, a gravidade do crime — vazamento de operação contra uma facção criminosa que atua em nível nacional — justifica a prisão preventiva. A função de presidente da Alerj não protege contra acusações de crimes comuns.

O que TH Jóias fazia dentro da Alerj?

Segundo a PF, TH Jóias atuava como elo entre o Comando Vermelho e o poder legislativo: usava sua influência para facilitar visitas a presos, obter informações sobre investigações e até pressionar servidores públicos. Ele também movimentava milhões por empresas fantasmas, lavando dinheiro da venda de armas e drogas. A PF afirma que ele tinha acesso a documentos sigilosos e usava sua condição de ex-deputado para manter contatos com parlamentares atuais.

O caso pode afetar outras lideranças políticas no Rio?

Sim. A PF já identificou outros 12 contatos estratégicos ligados a Bacellar que estão sob escuta. Entre eles, há assessores, ex-parlamentares e até funcionários da Casa Civil do Estado. A investigação está focada em descobrir se o vazamento foi um caso isolado ou parte de uma rede maior. A suspeita é que o Comando Vermelho tenha infiltrado seus agentes em cargos de confiança em múltiplas esferas do poder.

O que acontece agora com Bacellar?

Bacellar permanece preso preventivamente enquanto o STF analisa os elementos da acusação. Se condenado, pode pegar até 12 anos de prisão por obstrução de justiça e associação criminosa. Ele pode ser afastado definitivamente da presidência da Alerj por decisão do plenário da casa, mas isso só ocorrerá após o julgamento. Enquanto isso, a Alerj segue sob interinidade do vice-presidente, enquanto a população exige transparência.

Por que o Fantástico teve acesso exclusivo ao depoimento?

A TV Globo obteve acesso aos documentos por meio de um pedido de liberação de informações públicas, aprovado pela Justiça. O Ministério Público Federal autorizou a divulgação de trechos que não comprometessem a investigação. O programa escolheu revelar o caso porque envolve diretamente a integridade das instituições democráticas — um tema de interesse público de primeira ordem.